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O Papa aos religiosos: não à tentação do “faraonismo”

maio 1, 2017

Os sacerdotes e religiosos não devem ceder «às tentações que encontram cada dia em seu caminho. Gostaria de destacar algumas significativas. Vocês as conhecem porque  foram muito bem descritas  pelos primeiros monges de Egito». Não devem «se deixar arrastar, e não guiar», «queixar-se constantemente», cair na «murmuração» e na «inveja», «comparar-se com os demais», cair no «individualismo», «caminhar sem rumo e sem meta». Devem cuidar também da tentação do «faraonismo», quer dizer «de endurecer o coração e fechá-lo ao Senhor e aos demais. É a tentação de se sentir por cima dos outros e submetê-los por vanglória; de ter a presunção de se deixar servir em lugar de servir». È o que disse o Papa Francisco ao clero copto – católico, aos religiosos e às religiosas, aos seminaristas, durante o encontro com eles no Seminário Patriarcal Al Maadi, do Cairo, último ato antes da despedida final de sua viagem de dois dias ao Egito.
Segundo o Papa, «o Bom Pastor tem o dever de guiar o rebanho», e «não pode se deixar levar pela desilusão e pelo pessimismo». «É fácil sempre culpar os outros: pelas carências dos superiores, as condições eclesiásticas ou sociais, pelas poucas possibilidades», porém o consagrado é aquele que «transforma cada obstáculo em uma oportunidade, e não cada dificuldade em uma desculpa. Quem sempre anda se queixando, na realidade não quer trabalhar».
Francisco também se referiu ao «sério perigo» do consagrado que «em vez de ajudar os pequenos a  crescerem e de se regozijar com o êxito de seus irmãos e irmãs, se deixa dominar pela inveja e se converte em alguém que machuca os outros com a murmuração»: a inveja «é um câncer que em pouco tempo destrói qualquer organismo: “Um reino dividido internamente não pode subsistir; uma família dividida não pode subsistir”. De fato, “pela inveja do diabo entrou a morte no mundo”. E a murmuração é o instrumento e a arma».
Segundo o Papa, «comparar-nos com os que estão melhor nos leva com frequência a cair no ressentimento», e « comparar-nos com os que estão pior, nos leva, com frequência, a cair na soberba e na preguiça », por isso « quem tende sempre a se comparar com os outros acaba paralisado».
A última tentação que é preciso evitar é a do consagrado que «perde sua identidade e acaba por não ser “nem carne nem peixe”» e «vive com o coração dividido entre Deus e a ‘mundanidade’».
Francisco agradeceu aos presentes «por seu testemunho e por todo o bem que realizam cada dia, trabalhando em meio a numerosos desafios e, frequentemente, com poucas consolações. Desejo também animá-los. Não tenham medo do peso de cada dia, do peso das circunstâncias difíceis que alguns de vocês têm que atravessar. Nós veneramos a Santa Cruz, sinal e instrumento de nossa salvação. Quem foge da Cruz, escapa da ressurreição».
Depois continuou citando o Evangelho de Lucas: “Não temas, pequeno rebanho, porque vosso Pai quis dar-lhes o reino”.Trata-se, portanto, de crer, de dar testemunho da verdade, de semear e cultivar sem esperar ver a colheita. De fato, nós recolhemos os frutos que muitos irmãos consagrados e não consagrados semearam, que trabalharam generosamente na vinha do Senhor. Sua  história está repleta deles». E entre «tantos motivos para desanimar, de numerosos profetas de destruição e de condenação, de tantas vozes negativas e desesperadas, sejam vocês uma força positiva, sejam a luz e o sal desta sociedade, a locomotiva que empurra o trem para frente , conduzindo-o à meta, sejam semeadores de esperança, construtores de pontes e artífices de diálogo e de concórdia». Tudo isto somente será possível «se a pessoa consagrada não ceder às tentações que encontra cada dia em seu caminho».

São sete as tentações elencadas:
1- A tentação de se deixar arrastar, e não guiar. O Bom Pastor tem o dever de guiar seu rebanho (cf. Jo 10,3-4), de conduzi-lo para verdes prados e para as fontes de água (cf. Sal 23). Não pode se deixar arrastar pela desilusão e pelo pessimismo: «Porém, o que eu posso fazer?». Estar sempre cheio de iniciativas e criatividade, como uma fonte que continua brotando inclusive quando está seca. Saber dar uma carícia de consolo, ainda quando seu coração esteja partido. Saber ser pai quando os filhos o tratam com gratidão, e, sobretudo, quando não são agradecidos (cf. Lc 15,11-32). Nossa fidelidade ao Senhor nunca pode depender da gratidão humana: «Teu Pai, que vê o que está escondido, te recompensará» (Mt 6,4.6.18).
2- A tentação de se queixar continuamente. É fácil culpar sempre os outros: pelas carências dos superiores, pelas condições eclesiásticas ou sociais, pelas poucas possibilidades. Contudo, o consagrado é aquele que com a unção do Espírito transforma cada obstáculo em uma oportunidade, e não cada dificuldade em uma desculpa. Quem anda sempre se queixando, na realidade não quer trabalhar. Por isso o Senhor, dirigindo-se aos pastores disse: «fortalecei as mãos débeis, robustecei os joelhos vacilantes» (Hb 12,12; cf. Is 35,3).
3- A tentação da murmuração e da inveja. O perigo é grave. O consagrado, em lugar de ajudar os pequenos a crescerem e de se regozijar com o êxito de seus irmãos e irmãs, se deixa dominar pela inveja e se converte em alguém que fere os outros com a murmuração. Quando, em lugar de se esforçar para crescer, destrói os que estão crescendo, e quando em lugar de seguir os bons exemplos, julga-os e lhes tira o valor. A inveja é um câncer que destrói qualquer organismo em pouco tempo: «Um reino dividido internamente não pode subsistir; uma família dividida não pode subsistir» (Mc 3,24-25). De fato, «pela inveja do diabo a morte entrou no mundo» (Sb 2,24). E a murmuração é o instrumento e a arma.
4- A tentação de se comparar com os outros. A riqueza se encontra na diversidade e na unicidade de cada um. Comparar-nos com os que estão melhor leva-nos, com frequência, a cair no ressentimento, e comparar-nos com os que estão pior leva, muitas vezes, a cair na soberba e na preguiça. Quem tende sempre a se comparar com outros acaba paralisado. Aprendamos dos santos Pedro e Paulo a viver a diversidade de caráter, carismas e opiniões, na escuta e docilidade ao Espírito Santo.
5- A tentação do «faraonismo» (estamos no Egito!), quer dizer, de endurecer o coração e fechá-lo ao Senhor e aos demais. É a tentação de se sentir por cima dos outros e de submetê-los pela vanglória, de ter a presunção de se deixar servir em lugar de servir. É uma tentação comum que aparece desde o começo entre os discípulos, os quais — diz o Evangelho— «pelo caminho tinham discutido quem era o mais importante» (Mc 9,34). O antídoto a este veneno é: «Quem quiser ser o primeiro, seja o último de todos e o servidor de todos» (Mc 9,35).
6- A tentação do individualismo. Como diz o conhecido provérbio egípcio: «Depois de mim, o dilúvio». É a tentação dos egoístas que pelo caminho perdem a meta e, em vez de pensarem nos outros, só pensam em si mesmos, sem experimentar nenhum tipo de vergonha, ao contrário, se justificam. A Igreja é a comunidade dos fiéis, o corpo de Cristo, onde a salvação de um membro está vinculada à santidade de todos (cf. 1Co 12,12-27; Lumen gentium, 7). Pelo contrário, o individualista é motivo de escândalo e de conflito.
7- A tentação de caminhar sem rumo e sem meta. O consagrado perde sua identidade e acaba por não ser «nem carne nem peixe». Vive com o coração dividido entre Deus e a “mundanidade”. Esquece seu primeiro amor (cf. Ap 2,4). Em realidade, o consagrado, se não tem uma clara e sólida identidade, caminha sem rumo e, em lugar de guiar os demais, os dispersa. Vossa identidade como filhos da Igreja é a de ser coptos – isto é, arraigados em vossas nobres e antigas raízes— e ser católicos – isto é, parte da Igreja una e universal: como uma árvore que quanto mais estiver enraizada na terra, cresce mais alto até o céu. 

Publicado em Vatican Insider

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