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Somente uma Europa que defenda os direitos das pessoas pode estar orgulhosa de si mesma

junho 17, 2017

O crescente clima de hostilidade para a entrada de pessoas refugiadas em território europeu é consequência, em grande parte, das políticas migratórias cada vez mais restritivas para aqueles que procuram refúgio seguro. Estas políticas restritivas têm seu reflexo nos recentes discursos adotados no seio dos Estados membros da União Europeia. Contudo, as pessoas refugiadas continuam fugindo de seus países de origem. Segundo ACNUR, 65,3 milhões de pessoas se viram forçadas a abandonar seu lugar de origem e 21,3 milhões são refugiadas.
Em setembro de 2015, a Comissão Europeia propôs aos Estados membros a recolocação de  160.000 pessoas e o reassentamento de 20.000 no prazo de dois anos. Hoje, o número total de recolocações realizadas pelos Estados membros da União Europeia sobe a 13.546, e o de reassentamentos a 14.422. No caso da Espanha, foram acolhidos somente 1.212 refugiados dos 17.337 comprometidos, dos quais 878 por recolocação e 334 por reassentamento. A falta de vontade política se reflete no não cumprimento das cotas, dado que a maioria dos Estados ainda está muito longe de alcançá-las. Ante o fracasso na gestão migratória, os Estados membros optaram por tratar de impedir que refugiados e migrantes possam entrar em seu território.
É que, além disso, as medidas contra as pessoas migrantes em situação irregular se endureceram consideravelmente. Em 02 de março passado, a Comissão Europeia se posicionou duramente contra aquelas pessoas consideradas migrantes econômicos que não têm direito a asilo. Neste caso, se pede aos Estados que ampliem até o período máximo de detenção previsto na Diretiva de Retorno (18 meses) as pessoas que se encontram em situação irregular. Deste modo se pretende fomentar a expulsão de migrantes em situação irregular incrementando o número de retornos a seus países de origem. As políticas migratórias por parte de Europa se endureceram desde o principio do ano, fomentando o retorno dos migrantes em situação irregular.
Em 03 de fevereiro passado teve lugar a “Cumbre de Malta” onde se reuniram os chefes de Estado da UE para debater os aspectos exteriores da migração, concretamente a rota do Mediterrâneo Central. A resolução do Conselho Europeu tem como objetivo garantir o controle das fronteiras exteriores e conter os fluxos ilegais para a UE através de um novo acordo com a Líbia. Pelo acordo entre a UE e Turquia, que completou um ano, se reduziram drasticamente as chegadas de pessoas refugiadas através da rota do Mediterrâneo Oriental.  Porém, grande parte das 50.000 pessoas refugiadas e migrantes segue em campos na Grécia, em más condiciones e em um clima de desesperança cada vez maior. Também as mortes no mar se incrementaram. No final de 2016 as mortes no Mediterrâneo ascenderam a 5.000 pessoas frente às 3.771 ocorridas em 2015, e continuou no decorrer do ano; 336 pessoas perderam a vida no mar. A rota do Mediterrâneo Central se converteu na via mais perigosa de entrada na Itália, com mais de 180.000 chegadas em 2016, e sua maioria procedente da Líbia. Com o novo acordo, a UE pretende devolver à Líbia os migrantes em situação irregular, melhorando a vigilância das fronteiras terrestres, formando e apoiando os guarda-costas líbios, com o pretexto de frear os traficantes de pessoas e intensificar as operações de salvamento. Ademais, o Conselho Europeu de Justiça e Assuntos de Interior se reuniu em 27 e 28 de março para levar adiante as medidas que considera necessárias para frear a entrada de imigrantes em situação irregular, entre elas, reforçar as fronteiras exteriores à UE e aplicar uma política de retorno mais eficaz.
As respostas no se fizeram esperar. O alto comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos denunciou as tentativas da União Europeia de externalizar a política migratória. Diversas organizações sociais reclamaram a necessidade de respeitar os direitos humanos e não colocar em risco a vida daquelas pessoas que buscam asilo. Devolver as pessoas que buscam refúgio a terceiros países não seguros, ou contê-las em precárias condições, é expô-las a vulnerações de direitos humanos. A resposta para acabar com o tráfico de pessoas deve ser a abertura de vias de acesso legais e seguras à Europa e não os acordos restritivos para frear a migração. Estes acordos, longe de solucionar de maneira adequada as migrações, contribuem a vulnerar os direitos fundamentais das pessoas, lançam com clareza a mensagem de que não são bem-vindas violando o direito humanitário e de asilo, contribuem ao incremento da xenofobia nas sociedades de acolhida, e não conseguem os objetivos que dizem perseguir, como acabar com as máfias. No 60º aniversário da União Europeia, urge reivindicar uma Europa com os princípios e valores fundacionais de justiça, liberdade, solidariedade e defesa do Estado de direito, que proporcione proteção e acolhida às pessoas refugiadas e migrantes, e que garanta seus direitos fundamentais. Como assinalam diversas organizações sociais, somente uma Europa que defenda os direitos das pessoas, sem exceção, pode estar orgulhosa de si mesma.

Por Valeria Méndez de Vigo e Carla Sala
Publicado em Cristianismo y Justicia

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